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Bem-estar e Saúde / Sinta & Liga

Cartinha de Natal: querido Papai Noel, me dá um tempo?

De tão raro, este se tornou um bem valioso, que não pode ser comprado e muito menos desperdiçado

*Wal Reis Publicado em 22/12/2020, às 08h00

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A gente passa o ano fracionando tanto o nosso tempo para os outros, que acaba não sobrando nada dele para usar como realmente gostaríamos - tookapic/Pixabay
A gente passa o ano fracionando tanto o nosso tempo para os outros, que acaba não sobrando nada dele para usar como realmente gostaríamos - tookapic/Pixabay

Querido Papai Noel, espero que este meu pedido não chegue atrasado ou que você já tenha saído da Lapônia e esteja sem sinal de internet. Eu sei, eu sei: deveria ter me organizado melhor e mandado a cartinha dentro do prazo estabelecido por sua empresa, cumprindo os protocolos que sempre me perseguem. Mas o meu presente tem tudo a ver com este atropelo: Noel, eu quero pedir tempo.

Sabe tempo? Aquele que é fundamental para fazer as coisas com calma, organizadamente, sem ter que sair de casa tão atropelado que esquece a alma no elevador? Ou até mesmo para ficar zapeando a TV e reclamando, com ares de tédio, que não tem nada de bom para ver? Ou para passar uma tarde inteira lendo e cochilando de pijama e cabelo sujo? Aquele que é vital para fazer coisas ainda menos nobres, como falar mal dos outros numa mesa de café com uma amiga, sem olhar e-mails de doze em doze segundos, ou ter o WhatsApp apitando freneticamente, provando, a cada nova mensagem, que você tem que fracionar tanto o seu tempo para os outros, que acaba não sobrando nada dele para usar como realmente gostaria? Pois é: eu queria este tipo de tempo.

Queria abrir minha agenda de manhã e encontrar a página em branco, não porque estava tão cansada na noite anterior que esqueci de escrever ali as tarefas da data, mas porque o dia é totalmente meu mesmo. Exclusivamente meu. Sem ninguém me dizendo que “já que” estou livre podia fazer isso ou aquilo. Não, Noel, me desculpe. Eu sei que é época de Natal, de ser solidário. Meu pedido é pessoal e intransferível e meu desejo é usá-lo sozinha, sem dar nem um pedacinho para ninguém.

NÃO TÃO BOA MENINA
Se eu fui boazinha para ser merecedora do presente? Bem, digamos que o projeto “boazinha 2020” teve alguns bugs. Tentei ser uma mais paciente, mas vamos combinar que tem gente que vem para a Terra para testar nossa capacidade de manter a boa educação, né?

E me esforcei para ser amiga dos meus amigos, sem julgamentos ou pré-conceitos, até que chega aquele filho da mãe, que você escutou por 56 horas chorando o corno que tomou da mulher, e avisa com a cara mais lavada do mundo que está voltando às boas com a ex. Fala sério. Difícil segurar a vontade de descer do salto e quebrar a cabeça engalhada dele. Porém, em linhas gerais, eu diria que deu para pontuar positivamente e meu desejo deveria ser considerado.

Também fui sagaz cumprindo todas as incumbências que esperavam que cumprisse: entreguei trabalhos nos prazos, cuidei de quem estava sob minha jurisdição, mantive a casa em ordem, as contas pagas e o cachorro alimentado. E antes de dormir, eu jurava que conseguiria fazer algo verdadeiramente por mim no dia seguinte, mesmo que fosse colocar uma música triste para ter o direito de um tempo para sentir minhas próprias dores. Mas falhei miseravelmente neste último quesito.

Por isso, vou esperar acordada pelo meu presente e prometo não fazer como fazia com minhas bonecas que, alguns dias depois do Natal, já eram deixadas de lado. Porque depois de um tempo na vida, Noel, finalmente aprendemos o valor de coisas que a gente não compra, mas que cobram um preço alto demais quando não as temos.

Wal Reis é jornalista, profissional de comunicação corporativa e escreve sobre comportamento e coisas da vida. Blog: www.walreisemoutraspalavras.com.br