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Criança versus ativismo: como os pequenos podem ajudar a mudar o mundo?

Ativismo: como as crianças podem ajudam a resolver as causas importantes do planeta

*Priscila Correia, do Aventuras Maternas, colunista de AnaMaria Digital Publicado em 04/11/2022, às 08h00

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O ativismo de inúmeras causas em todo o planeta tem ganhado cada vez mais destaque - Unsplash
O ativismo de inúmeras causas em todo o planeta tem ganhado cada vez mais destaque - Unsplash

Já se perguntou sobre aquela clássica questão “o que posso fazer por um mundo melhor?”. Talvez, na vida adulta, não, mas quando criança, certamente sim – e, provavelmente, já fez algumas ações para isso. A diferença dos tempos atuais é que, com a ajuda das tecnologias e da velocidade da informação, as crianças encontram coro mais rapidamente e conseguem se engajar coletivamente, mesmo com pouca idade.

O ativismo de inúmeras causas em todo o planeta tem ganhado cada vez mais destaque, e não apenas por ser algo politicamente correto. Milhões de pessoas, independentemente da idade, têm realizado pequenas ou grandes atitudes pelo bem de todos e se dedicam a mudar, ainda que pouco a pouco, a mentalidade de quem está no seu entorno.

Por aqui, por exemplo, meu filho mais velho é defensor ferrenho do meio ambiente. Participa de projetos em defesa da Amazônia, estimula os colegas a praticarem um consumo mais consciente, reutiliza, recicla e reinventa. Além disso, se junta a outras pessoas para outras ações, como ajudar a arrecadar dinheiro para comprar material escolar para crianças menos favorecidas. E não é um projeto que realiza sozinho. Embora na maioria das vezes a ideia parta dele, consegue unir as pessoas para pensar em um bem maior, que beneficie não apenas a ele, mas a todos.

A pedagoga Márcia Barbacena Bueno de Carvalho, professora do Ensino Fundamental do Colégio Carlos Drummond de Andrade, diz que é muito importante incentivar a criança e o adolescente a defender uma causa e que o ativismo nessa fase é uma excelente oportunidade para que nossos filhos entendam sobre respeito e outros temas relevantes para a sociedade. “Eles são protagonistas, constroem seu pensar, defendem as suas ideias, gostam de debater sobre o assunto apresentado, possuem mais acesso às informações. As crianças e os adolescentes fazem parte desta sociedade e, embora ainda não seja responsabilidade deles resolver os problemas, podem refletir sobre”, explica.

E para falar um pouco mais sobre o tema e como nós, mães, podemos entrar nessa empreitada dos nossos filhos, a coluna de hoje é sobre ativismo.

PEQUENOS NA IDADE, MAS GRANDES NO PROPÓSITO

Todos nós sabemos que as crianças, habitualmente, se espelham nos adultos, como os pais. E é por isso que é tão importante incentivarmos nossos filhos sobre questões sociais e ambientais. Para Adriana Drulla, mestre em Psicologia Positiva e especialista em Parentalidade Consciente, é importante que os pais cultivem na criança e adolescente um senso de responsabilidade pelo meio ambiente, um senso de comunidade, um senso de interdependência que nós devemos ter com outras pessoas e seres vivos.

“Acho que a criança pequena já tem muito essa consciência. Então, a ideia não é nem incentivar, mas cultivar isso dentro de casa, para que tenhamos um bom futuro, e para isso, precisamos cuidar melhor do nosso planeta, cuidar melhor uns dos outros. Outra razão é o individualismo excessivo em termos psíquicos. A gente já sabe que esse auto centramento que há hoje faz mal para nosso desenvolvimento psicológico. Ele é, inclusive, uma das grandes causas de ansiedade e depressão. Então, cultivar essa interdependência, ajudar a criança a entender como ela pode ser útil para o outro e para o mundo, não só traz bons resultados para aqueles que recebem o cuidado, mas também para a própria criança. Eu sempre digo que uma das maiores fontes de significado da vida é nos sentirmos importantes para a comunidade em que estamos inseridos. A gente vê que nosso trabalho gera frutos que beneficiam um todo, o mundo. E esse é um dos grandes pilares da saúde mental”, pontua.

Na casa de Michelle Lanza, mãe de Eduarda, de 12 anos, a família costuma conversar sobre diversos movimentos, especialmente questões raciais e LGBTQIA+. A menina, inclusive, gosta de saber o motivo de cada causa ser defendida e o que está sendo discutido. "Sempre explicamos a importância de lutarmos pelas pessoas e animais e, quando ela tem alguma dúvida, nos pergunta. Se nós, adultos, conseguirmos responder seu questionamento, ok. Se não soubermos, estudamos todos juntos. Mas o interessante é que embora a gente incentive nesse caminho, muitas vezes parte dela mesma ir atrás das informações”, conta a mãe. E Eduarda já demonstra que seu interesse vai além de se informar: “Costumo reciclar material e economizar água para apoiar o meio ambiente, e sempre faço ações beneficentes para ajudar quem precisa. Quero mudar o mundo que vivemos porque ainda temos muita maldade, muita poluição e muita doença”, explica a menina, que pretende, no futuro, participar de ações voluntárias. “Se todos nós tivermos a ideia de mudar o mundo, a gente consegue.”

E o ativismo pelo meio ambiente também é uma pauta constante na família de Elizangela Gutierres, mãe de Pedro, de 8 anos. Ela conta que, embora falar sobre a importância da reciclagem e o uso consciente da água sempre tenham sido presentes no dia a dia, a escola do filho também trabalha com os alunos essas e outras questões que são importantíssimas para a sociedade. “Sempre procuro reforçar o que é discutido, fazendo-o pensar que tipo de mundo ele quer para os filhos e os netos dele. Acho importante "plantar" esta semente, para que ele possa refletir que as atitudes de hoje impactarão diretamente o amanhã. E tem dado certo. Tanto que ele se tornou um ‘disseminador’ do que aprende e espero que continue assim", ressaltou.

Há duas semanas, por exemplo, a escola em que estuda promoveu uma feira cultural, onde a turma falou sobre compostagem e poluição dos mares. "Ele e outras crianças tiveram que explicar o processo da compostagem para os visitantes, assim como falar como a poluição pode prejudicar a vida marinha e os impactos que provoca no meio ambiente”, exemplifica. E não é apenas na escola ou falando com outras pessoas que ele age para defender o que pratica. Em casa, durante a semana, ele é o "responsável" por separar o lixo que pode ser reciclado, como plástico e papel. E esse compromisso não é interrompido durante as férias, quando vai para a casa dos avós. “Ele costuma viajar para o interior, para a chácara dos meus sogros, onde, além da questão de separar o lixo, tem contato com o plantio de plantas e de verduras”, complementa a mãe.

A rotina de Ana Paula Silva de Azevedo, mãe de Thiago, de 13 anos, e Victor, de 17, também envolve muito bate-papo. “Conversamos bastante em casa e geralmente o Thiago já vem contando alguma questão do seu dia, como conversar com as amigas no intervalo sobre os direitos das mulheres, equidade de gêneros e diferenças salariais; ou quando, depois de assistir a uma reportagem sobre preconceito contra homossexuais, falamos sobre o respeito pela diversidade. Quando assistiu na TV sobre a guerra da Ucrânia, conversamos sobre a importância da diplomacia e dos políticos na paz mundial. Quando viu uma criança no farol pedindo dinheiro, falamos sobre educação e oportunidades de empregos e a importância de políticas públicas em relação a esse tema”, conta a mãe.

Sobre achar que esse interesse do filho por causas tão importantes vá se perpetuar quando crescer, ela não sabe responder. Porém, acredita que, independentemente da carreira que seguir, vai levar consigo esse desejo de mudança, de fazer diferente, de liderança, de ser o protagonista da história, de desafiar o status quo. “Esse interesse do Thiago de mudanças, melhorias, não se contentar com injustiças, me faz ter esperança de que podemos, sim, contribuir para uma sociedade melhor”, complementa.

Mas atenção: apenas incentivar que a criança se envolva em causas que pra ela faça sentido não basta. É preciso também que a família tenha essa preocupação genuína, que não seja um discurso da boca pra fora. “Por mais que seja difícil essa transição entre gerações como a nossa, que não teve essa educação voltada para a questão ambiental e social na escola ou na família, é preciso um esforço dos adultos. É uma transição difícil, mas que pode ser feita em pequenos passos. Por exemplo, vamos adotar o hábito de toda vez que a gente comprar uma coisa, a gente doar outra? Vamos pesquisar produtos que causem menos impacto no meio ambiente? Esses são apenas exemplos, é claro. Mas o importante é que os filhos percebam que o que os pais incentivam faz realmente parte da organização da família de uma forma geral”, complementa Drulla.

Além disso, lembra ela, é bastante importante não apenas que os pais pratiquem o que ensinam, mas que também ajudem quando os filhos demonstram um interesse maior sobre determinado tema. “Minha filha, Chiara, de 11 anos, criou um projeto para ajudar os refugiados. E quando eu percebi que ela estava realmente engajada, que queria ir além de saber mais sobre o assunto, ajudei a encontrar uma ONG para onde pudesse direcionar os recursos que queria levantar. Meu papel foi validar o interesse que ela estava tendo, a importância da ação, não só com palavras, mas me envolvendo, doando meu tempo e incentivando ela a fazer algo em benefício de algo maior”, conta.

“Quando comecei a estudar a questão da imigração e dos refugiados, entendi que ajudar era um papel de todos nós. E então conversei com minha mãe sobre essa vontade e ela me levou a pensar sobre como eu gostaria de ajudar. Como eu já fazia sabonetes artesanais, resolvi fazer os produtos, montar kits e passei a vender online para arrecadar os recursos necessários. Minha mãe me ajudou muito”, diz a menina - no total, Chiara levantou R$2.700, que foram doados para uma ONG que ajuda refugiados no Brasil.

UNIÃO QUE FAZ A DIFERENÇA

Na educação de crianças e adolescentes, família e escola devem, habitualmente, caminhar juntos. E no incentivo ao ativismo isso não é diferente. Para Camila Menon, especialista em primeira infância, essa prática deveria ser feita em um trabalho conjunto entre pais e escola, com um complementando o trabalho do outro (em todos os temas, não apenas esses). Para exemplificar melhor, um aluno, quando é alfabetizado em sala de aula, ainda assim, precisa do trabalho dos pais em casa, encorajando essa criança a ler, porque esta se aperfeiçoa com a prática. Logo, se não existe esse trabalho em conjunto e se essa criança não apresentar um interesse inerente à leitura, provavelmente não desenvolverá a leitura com excelência.

"Então, se a escola já apresentou o conteúdo, explicou a importância e direcionou formas de se preservar o ambiente, por exemplo, considerando que esse tema é do interesse de todos, o que os pais estão fazendo efetivamente pra incentivar a prática? Digo, não adianta nada a escola apresentar um caminho pro aluno, se em casa ele não tem incentivo ou a quem modelar (ex: pais que não se importam com reciclagem, gastam água lavando carro, tem consumo descontrolado etc). A conta não bate, entende?”, enfatiza.

Mara Pérez, que é orientadora educacional do Colégio Pentágono, explica que, durante a infância e a adolescência, os jovens estão desenvolvendo a sua identidade, conhecendo o mundo, a sociedade e os problemas intrínsecos da nossa atualidade; e incentivar o ativismo é uma forma de colocá-las como protagonistas na solução dos desafios do mundo, permitindo que entendam os cenários, as desigualdades e que, a partir dessa conscientização, se tornem empáticas e capazes de pensar e atuar para um mundo melhor e um futuro que com certeza eles viverão.

No Colégio Pentágono, por exemplo, a cada ano um tema diferente é abordado com os alunos. Durante as aulas, eles precisam se envolver, pesquisar, se aprofundar em perguntas norteadoras que, no fim do ano, resultarão em projetos, ideias e soluções. “O objetivo é que os nossos estudantes sempre tenham alguma temática real do mundo para abordar em sala de aula. Entre os percursos que o aluno viverá estão alimentação saudável, sustentabilidade, igualdade, cidades do futuro. Com metodologias ativas, os alunos se tornam agentes das transformações que eles querem para o mundo”, explica Mara.

Mas existe uma idade ideal para começar a incentivar as crianças a lutarem por uma causa? Para Camila, o incentivo de respeitar o meio e o outro devem ser apresentados desde sempre. “Por exemplo, um bebê precisa de direcionamento pra entender a diferença entre fazer carinho e dar um tapa, não é mesmo? O mesmo conceito serve pra qualquer temática. O quanto antes o tema for normalizado, menos "lutas por causas" teremos pela frente. Já o incentivo é mais eficiente quando existe o interesse e não é a idade que define isso, e sim o entendimento que a criança tem do mundo. Logo, se você trouxer lógica e explicar a necessidade de cuidar do meio ambiente pra uma criança de 4 anos, ela vai responder de uma forma menos profunda que uma criança de 12 anos. Mas isso não quer dizer que o trabalho que se faz com a criança de 4 anos é menos importante ou ineficiente”, enfatiza.

Para Mara, muitas vezes as causas apoiadas pela criança vêm da experiência de vida dela. “Encontrar um gatinho machucado na rua pode acender a chama que a fará abraçar a causa animal. Ou mesmo vendo que os pais são ativos em causas sociais e, assim, também envolvem os filhos nas atividades que realizam. Tudo isso impacta a criança. Hoje em dia, com o crescimento do debate sobre igualdade de gênero, vemos muitos dos nossos alunos mais conscientes sobre o tema. O que anos atrás poderia provocar bullying, atualmente é acolhido pelos colegas que também abraçam a causa de lutar pelos direitos igualitários para todos”, complementa.

E, além do incentivo da escola e da família, há casos em que o ativismo parte dos próprios filhos, sem que seja sugestão de nenhum adulto: “Temos um grupo de meninas do Ensino Fundamental que defendem e apoiam a causa da diversidade de gênero, sem que o colégio ou as famílias tenham proposto o tema. Elas, eventualmente, promovem rodas de conversa sobre orientação sexual, onde, amparadas por professores, orientadores e coordenadores, informam e tiram dúvidas dos colegas sobre este tema. Tudo repleto de muito repertório e sem nenhum tipo de preconceito. Além disso, em aulas de Projeto de Vida, os alunos sugerem falar sobre bullying, um tema muito comum nessa fase da adolescência e que precisa ser retomado frequentemente”, conclui a orientadora educacional do Colégio Pentágono.

5 DICAS PARA PAIS E FILHOS ‘TRABALHAREM’ JUNTOS

Como eu disse no início da matéria, meu filho participa de um projeto para proteger a Amazônia, chamado Amazonia de Pé. Desde o início, a ideia em se engajar partiu dele. Entretanto, todos da família e amigos se movimentaram para ajudar. A seguir, apresento 10 dicas de como ajudar o seu filho a lutar pelo que acredita e que, quem sabe, possa se tornar o objetivo de vida dele quando crescer.

1. Tudo começa pela conscientização

Conversar sobre temas como diversidade, preocupações ambientais e sociais e explicar o por quê devemos nos preocupar com esses assuntos é o primeiro passo.

2. Estimule a pensar fora da caixa

É muito comum que as crianças se comparem com os colegas da escola na hora de repetir comportamentos. É fundamental manter o diálogo aberto sobre que atitudes podem ser alteradas para o bem do planeta, respeitando o próximo. Exemplo: se o coleguinha joga lixo no chão, não faça igual a ele, nem brigue. Estimule a fazer diferente. Tenha sempre o diálogo positivo como base para conversar com o próximo e estimule isso no seu filho também.

3. Conheça a realidade de perto

A melhor forma de fazer com que a criança se preocupe com o meio ambiente e os problemas sociais é incentivando-a a explorar esse tema e conhecer mais sobre o assunto. Além da experiência prática, o conhecimento teórico ajudará na compreensão completa da situação. Visitar instituições, se engajar em causas com data para entregar donativos, por exemplo, ajuda a promover o comprometimento.

4. Tenha a empatia como valor básico

Se colocar no lugar do outro é a forma mais genuína para se tornar uma pessoa mais solidária, não apenas com pessoas que tenham necessidades de alimento ou doações, mas também com amigos e familiares. Assim, ao ensinar solidariedade para crianças, comece fazendo com que elas entendam como seria estar naquela situação. E como gostariam de ser tratadas.

5. Leve novas pautas para a conversa em casa

Assistir filmes, ler livros, conversar sobre situações que vimos nas ruas ou que estão acontecendo em algum local do planeta são formas de iniciar o assunto dentro de casa e motivar a família a entender de fato os problemas, assim como buscar soluções dentro do alcance de cada um: plantar árvores, doar livros e brinquedos, fazer eventos de arrecadação, apadrinhar crianças assistidas por instituições, mobilizar mais amigos em torno de uma causa. São apenas algumas ideias.