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Lázaro Ramos e Marcos Piangers falam sobre o rótulo de perfeição da paternidade

Além deles, outras pais e especialistas relembram que o convívio com o pai é tão importante quanto com a mãe

*Priscila Correia, do Aventuras Maternas, colunista de AnaMaria Digital Publicado em 12/08/2022, às 10h00

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Stella Carvalho/Divulgação
Stella Carvalho/Divulgação

“Eu acredito profundamente que, quando a gente embarca na aventura da paternidade, tudo fica melhor, porque vamos construindo um ser humano melhor. E, a partir daí, nunca mais tem rotina”. É com essa declaração de Lázaro Ramos, protagonista de “Papai é Pop”, que estreou ontem nos cinemas de todo o país, que começamos a coluna de hoje, em homenagem ao Dia dos Pais.

O novo filme é baseado no livro homônimo Marcos Piangers, que é um sucesso literário desde o seu lançamento. E, embora esse reconhecimento seja mais do que merecido, nem sempre fez com que o autor se sentisse confortável com a definição de perfeição como pai que muitos têm sobre ele.

“Quando minha filha tinha uns três anos, a gente estava no supermercado e ela queria um doce. Falei que não e ela se jogou no chão, fazendo birra. Eu me abaixei, tentei conversar e consolar. Então, um cara que estava passando me reconheceu e foi vindo na minha direção. Ele parou ao meu lado, viu aquela cena, e disse: “Você vê, meu irmão, escrever é mais fácil, né?”. O processo de escrever realmente leva os outros a entenderem que eu esteja nesse lugar de perfeição", observa Piangers.

No entanto, ele lembra que, na realidade, a beleza da paternidade está exatamente na imperfeição, como em episódios como esse. Mas, apesar do desconforto com esse título, e por achar uma injustiça com sua esposa e outras mães que são super dedicadas, mas não igualmente reverenciadas, ele entende a importância de seu trabalho no intuito de chamar a atenção para o tema. “É preciso conversar sobre paternidade. E, se todo mundo está me dando esse microfone, eu vou dar o meu melhor discurso. E agora, passando esse bastão para o Lázaro, que ele leve essa chama pra frente, para que essa discussão fique cada vez maior, alcance cada vez mais pessoas, e a gente possa ter uma transformação na masculinidade”, complementa.

Sabendo que é um processo diário, Lázaro Ramos, que já é visto como referência para muitos, leva para as telas a história de um pai de primeira viagem que não sabe nada sobre o assunto e vai aprendendo na prática. “É um filme que discute de forma bem-humorada e leve um tema que a gente deveria discutir todos os dias. Acredito que os pais vão se sentir acolhidos e estimulados. Acolhidos em suas dúvidas sobre paternidade. E estimulados a enfrentar essa aventura de peito aberto e sabendo que é um processo de construção diário", conta.

Papai é pop
Lázaro Ramos e Paolla Oliveira vivem um casal em 'Papai é Pop' (Crédito: Stella Carvalho/divulgação)

Ele diz ter se visto em todas as histórias vividas por Tom, seu personagem no longa. "Me identifico muito com ele, por ser um cara dessa geração que não quer repetir ausências que os pais de outras gerações provocaram. Mas, ainda assim, vamos aprendendo ao longo do processo e cometendo falhas. Esse lugar da não perfeição, mas do desejo de fazer da melhor maneira possível, é algo que eu me identifico muito. E também o fato de ele ser um pai brincalhão, amoroso, próximo, que são características da minha paternidade. Já a característica fundadora do personagem, que é não ter um pai presente, eu não experimentei. O dele foi ausente e o meu foi muito presente”, conta.

E AGORA?

Lázaro conta, ainda, que ficou muito mais inseguro quando se tornou pai, querendo ser um bom exemplo e fazer direito, mas se deparando com as suas próprias incapacidades ou as coisas que ainda não conhecia. “Por outro lado, a sensação de novidade que traz uma leveza pra vida. Quando me tornei pai, lembro da sensação de sorrir sem saber exatamente o motivo. E revivi esses momentos durante as filmagens, o que é algo bom de lembrar, porque alimenta as outras fases da criação dos filhos”, lembra.

E para os que vão se tornar pais em breve, Lázaro deixa um recado: “Dá medo, insegurança, incerteza. Mas, por outro lado, dá muito prazer, propósito, orgulho de cada conquista, tanto da criança quanto sua nessa relação. E eu acredito profundamente que quando a gente embarca na aventura da paternidade, tudo fica melhor, porque vamos construindo um ser humano melhor. E, a partir daí, nunca mais tem rotina."

PAI, AMIGO E EXEMPLO

A paternidade é uma aventura, assim como a maternidade, mas ninguém nunca está totalmente preparado para o que está por vir. Ricardo Correa, pai de Pedro, de 10 anos, conta que, embora a vontade de ser pai já existisse, foi apenas quando ele e a ex-mulher descobriram a gravidez que começou a se indagar sobre a paternidade. “Quando eu pensava sobre o assunto, a minha referência era o meu pai que, embora presente e amoroso, por ser 20 anos mais velho que minha mãe e de outra geração, não participava do meu dia a dia na prática. Para ele, o importante era prover boa educação, saúde, conforto etc", ressalta.

Então, quando descobriu que seria pai, a minha maior ambição de Ricardo era que o filho o visse também como amigo. E assim tem sido. "Eu estou sempre com ele, brincamos, conversamos, tudo que faço na minha vida tem a sua participação (...) Depois que o Pedro nasceu, eu descobri um conjunto de sentimentos que antes, por mais que eu racionalizasse a paternidade, não tinha ideia de como era esse sentimento, a profundidade de tudo isso. Pode parecer clichê o que digo, mas pra mim não há nada no mundo que se compare a ser pai, a ensinar, a acompanhar o desenvolvimento, a ser parte daquele indivíduo que você está criando”, comenta Ricardo.

Para a psicóloga Monica Machado, fundadora da Clínica Ame.C, o convívio com o pai é tão importante quanto com a mãe, sendo que cada um deles terá o seu papel no desenvolvimento na criança. “É necessário que a criança transite entre pai e mãe para que seu crescimento seja saudável, independentemente dos pais serem casados ou não. O que importa realmente é que tenham uma boa convivência e que a criança se sinta segura com ambos”, explica.

A psicóloga Sandra Regina LustosaTambara explica que o elo paterno é desenvolvido ao longo do tempo, com base na reciprocidade e sincronia entre pai e filho. “A partir dessa relação será construído um modelo interno funcional de apego, que vai moldar as memórias e experiências de afeto e de atenção da criança. E esse modelo vai impactar diretamente no seu comportamento, transformando-a em uma pessoa segura ou não”, pontua.

Mas Luiz Gonzaga Leite, psicólogo e Coordenador de Psicologia do Hospital Santa Paula, faz um alerta importante: a criação de uma criança não é apenas pagar as contas, colocar comida na geladeira, comprar um tênis novo ou um videogame. Estes itens tem sua importância, mas, além disso, é necessário o contato físico, a interação, ter tempo para estar juntos, brincar, contar histórias, ler um livro, acampar com os pequenos.

“Devemos lembrar que a presença física e o carinho dos pais formarão uma base solida sobre a qual os filhos construirão seus sonhos futuros. A criança necessita dos pais ou das pessoas que desempenham esse papel para se desenvolver não só fisicamente, mas emocionalmente. É na família que serão lançadas as bases da personalidade, é onde valores serão implantados na alma, é onde aprenderão a se relacionar, apreenderão a ser gente”, enfatiza.

O PESO DA AUSÊNCIA

Se, por um lado, a presença do pai na vida da criança é tão importante para seu desenvolvimento, é preciso lembrar que sua ausência, seja física ou emocional, também são igualmente sentidas. “Quando um pai não é presente, a criança pode desenvolver sentimentos de abandono, desvalorização, insegurança, solidão, baixa autoestima e dificuldades de relacionamento”, exemplifica Monica Machado.

Paloma Silveira Baumgart, especialista em primeira infância e Educadora Parental, alerta, ainda, que algumas crianças que não têm contato com o pai podem apresentar conflitos no desenvolvimento psicológico e cognitivo, bem como na elaboração de distúrbios de comportamento agressivos. “Elas tendem a desenvolver sentimentos de insegurança e também manifestar graves transtornos de ansiedade, já que a construção psicoafetiva apresenta deficiências", explica.

Além disso, também sofrem por não conseguirem desenvolver as habilidades adequadas para a convivência em sociedade, o que justifica a tendência a se isolar e não conseguir interagir de forma saudável com o outro. "Um outro fator importante é a incapacidade de seguir leis ou respeitar autoridades, pois as crianças com pais ausentes, especialmente as do sexo masculino, podem não conseguir se submeter a uma figura de autoridade, e como resultado disso podem se tornar rebeldes e adeptos da violação das regras, criando sérias consequências negativas para ela no futuro”, esclarece.

Mas, embora o papel do pai no desenvolvimento da criança seja fundamental para o fortalecimento cognitivo e social, a figura paterna não precisa, necessariamente, ser desempenhada pelo genitor. “Sabemos que muitas crianças não possuem contato permanente com seus pais biológicos, por diversos motivos. E que, ao longo da vida, esse papel acaba sendo desempenhado por um avô, um tio, um padrasto, um irmão, ou até muitas vezes uma mãe que faz um duplo papel”, lembra Paloma

MUITO ALÉM DE UMA QUESTÃO FINANCEIRA

A figura do pai na vida de uma criança/adolescente é fundamental. Porém, em algumas famílias, a presença física do genitor muitas vezes sequer existe, ainda que o nome deste esteja presente na certidão de nascimento do filho. Como dissemos, a importância do pai vai muito além de pagar contas. E como fica a responsabilidade deste quando não é presente emocionalmente?

A advogada Sabrina Martini Pisani explica que a lei pode punir um genitor, quando ele abandona o filho de forma afetiva, inclusive, esse abandono pode tipificar um crime da esfera penal, visto que o artigo 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente, que passou a vigorar acrescido do artigo 232-A, e prevê pena de detenção de um a seis meses para “quem deixar, sem justa causa, de prestar assistência moral ao filho menor de 18 anos, prejudicando-lhe o desenvolvimento psicológico e social”. “Aliado a esfera penal, esse abandono pode gerar um dever de indenizar por parte daquele que praticou o ato do abandono, ressaltando que afeto não é coisa, mas é sentimento, e por tal motivo é necessário que o pai saiba que apenas o pagamento da pensão alimentícia não quita o seu dever como genitor, pelo contrário, o seu dever vai além da questão financeira”, esclarece.

O também advogado Anthero Mendes Pereira Junior enfatiza, ainda, que o pagamento de pensão não é suficiente para que os pais se liberem das outras obrigações inerentes ao exercício do poder familiar, e os Tribunais Superiores vem pacificando a jurisprudência no sentido de que paternidade exercida de forma “irresponsável, desidiosa e negligente” poderá ensejar indenização por dano moral. “Dentro do que já se estabelece pelo ECA (estatuto da Criança e do Adolescente), mesmo que não se integre especificamente o dever de amar, se verifica que a paternidade deve ser exercida de forma responsável sem a demonstração de qualquer desprezo ao filho e muito menos expô-lo de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Portanto, o abandono emocional ou afetivo pode caracterizar ilícito civil e gerar indenização”, enfatiza.

RESPONSABILIDADE SOCIAL

Além da presença física e afetiva, vale lembrar que os pais assim como as mães têm uma enorme responsabilidade como seres sociais na formação das gerações futuras. Lázaro Ramos tem essa preocupação na rotina de seus filhos e também busca compartilhar suas ideias para outras famílias, por meio dos livros que publica.

Autor de seis obras, entre as quais 'Sinto o que Sinto', cujo objetivo é ajudar as crianças a entenderem e nomearem os próprios sentimentos, além de 'Edith e a Velha Sentada', que conta a história de uma menina muito esperta, mas que gasta muito do seu tempo em casa, no computador. Lázaro conta que se sente motivado a tornar o mundo um lugar melhor, mais seguro, de convivência mais harmoniosa, um lugar onde as pessoas possam crescer e se educar plenamente.

"Isso é algo que não sai da minha cabeça, não só pela responsabilidade com meus filhos, mas com todas as crianças. Os valores para meus filhos com certeza passam pela injeção de autoestima para eles se saberem possíveis e reconhecerem seus valores e qualidades, que são muitos! Amor para se saberem amados e acarinhados e terem consciência dos seus direitos e também dos seus deveres. Os limites dados em casa são muito importantes para quando a criança sai para o mundo, e lá em casa isso é muito presente. Dos limites éticos até os de educação básica. E é muito lindo vê-los crescendo nesses valores e, inclusive, hoje em dia sendo duas pessoas que levam isso para o mundo de forma muito natural e leve", finaliza.

Em tempo: se você é aquele tipo de pai que só aparece a cada 15 dias para ver os filhos, mas que adora postar fotos com eles como se fossem super pais, uma mensagem pra você. “Meu recado é o seguinte: nós fomos criados para fugir das coisas mais importantes da vida, fomos treinados para exercitar uma imaturidade masculina. A gente acha que relacionamento de longo prazo é um fardo muito grande, que um filho faz com que a nossa vida acabe, e que homem de verdade é esse malandro que consegue viver uma vida focada no seu conforto e seu prazer", analisa Piangers.

"Mas a verdade é que a gente, estatisticamente, se mata quatro vezes mais que as mulheres, temos mais problemas de saúde mental, morremos mais de forma violenta, agredimos mais e somos mais violentos com os outros e com quem a gente diz amar. Ou seja, temos uma série de coisas mal resolvidas. Então, quando fugimos das nossas responsabilidades, estamos sendo menos homens. Nos dizem o tempo todo “seja homem” e a gente entende que isso é ser violento, agressivo, competitivo etc. E, na verdade, ser homem é assumir as nossas responsabilidades. Então, quando um pai pega o filho de 15 em 15 dias e acha que está sendo malandro, na verdade está sendo pouco responsável, pouco conectado com ele mesmo, e está trilhando um caminho mais infeliz. Ser participativo exige esforço, mas o retorno é gratificante”, conclui Piangers.