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Meu filho é superdotado, e agora? Mães falam do diagnóstico e aprendizados

Mães falam do diagnóstico e aprendizados de terem um filho superdotado

*Priscila Correia, do Aventuras Maternas, colunista de AnaMaria Digital Publicado em 25/03/2022, às 08h00

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Mônica Torres Coelho e o filho, Lucas, cuja precocidade chamava a atenção desde bebê. - Arquivo pessoal
Mônica Torres Coelho e o filho, Lucas, cuja precocidade chamava a atenção desde bebê. - Arquivo pessoal

Facilidade em disciplinas na escola, preocupações sociais que nem adultos têm, facilidade com outros idiomas mesmo sem nunca ter frequentado aulas, ou convivido com pessoas de outros países, habilidades artísticas que chamam atenção. Seu filho já mostrou alguma vez um desses traços? Ou todos eles ao mesmo tempo? Se sim, é possível que ele seja superdotado. Mas como descobrir se essa realmente é a explicação para o comportamento da criança? E o que um laudo afirmativo pode representar na vida dela?

Mônica Torres Coelho, mãe de Lucas, de 4 anos, conta que o filho, desde bebê, chamava a atenção pela precocidade na fala, desenvoltura e demonstração de ter uma memória fora do padrão. Com 3 anos, ele montava quebra-cabeça de 60 peças. Seis meses depois,o menino começou a passar o dia todo desenhando e, em poucos meses, já fazia desenhos que chamavam a atenção de todos, especialmente pela riqueza de detalhes que continham, tudo de memória. "Foi quando um primo meu, que é desenhista, me alertou que ele poderia ter superdotação. Procurei, então, uma psicóloga especialista que, após avaliá-lo, me entregou um laudo”, conta.

Na casa de Bruna Soares Moraes, mãe de Leonardo, de 7 anos, e Guilherme, de 5, as altas habilidades das crianças foram verificadas por uma psicóloga indicada por conhecidos. Ela conta que os dois sempre foram muito espertos, cada um na sua área, mas em coisas específicas era como se tivessem um salto de conhecimento. "O mais velho sempre falou de forma muito perfeita, sem errar muitas letras, desenha muito bem e é muito bom em construir coisas, imaginar além do normal. Algo ligado à percepção mesmo, de coisas ao redor dele e até mesmo que ele ainda não conhece bem", conta.

Já o mais novo sempre foi muito interessado no alfabeto. "Sabia de cor logo que começou a falar, aprendeu cedo a contar quantas colheres de leite em pó eu colocava na sua mamadeira e sempre teve muita facilidade com línguas. Aos 3 anos, sentado à mesa, começou a contar em russo. Ali percebemos que algo estava acontecendo e percebemos que precisávamos de reforços”, comenta.

Já no caso de Álex, de 7 anos, filho de Barbara Varella Granja Reis Telles, a sugestão para a realização de uma análise do QI partiu da escola. “Já nos chamava a atenção que, desde bebê, antes dos 2 anos, ele sabia todo o alfabeto, em português e em inglês, além de identificar os números e mostrar muita curiosidade em aprender. A própria professora do infantil 4 solicitou, juntamente com a coordenadora, o teste de QI, visto que antes dessa idade ele também já lia algumas palavras”, diz a mãe.

Algum desses relatos te pareceu familiar? Se sim, a nossa coluna de hoje é pra você.

DIAGNÓSTICO PRECISO

Dizer que uma criança é mais ou menos inteligente que outra talvez não seja o mais correto. Afinal, tudo vai depender do quanto são esforçadas ou estimuladas desde a infância. Portanto, antes de entendermos um pouco melhor esse universo, é preciso dizer uma coisa: a superdotação independe da vontade do indivíduo, ou seja, não são os pais ou algo que se faça ou ensine que vai tornar alguém superdotado. Eles nascem assim. É sempre bom reforçarmos esse ponto para que nenhuma criança seja “forçada” pelos pais para alcançar esse ou aquele objetivo.

Mas como saber se meu filho é superdotado? Damião Silva, psicólogo especialista em Superdotação , Autismo e TDAH, explica que a identificação da superdotação é feita por meio de avaliações psicológicas ou psicoeducacionais. Muitas vezes, inclusive, é importante que essa avaliação seja multidisciplinar. "E o profissional responsável deve fazer uso de materiais com altas evidências científicas e os testes precisam ser validados e recomendados pelo conselho de classe do profissional. Além disso, eles captam informações da família, da escola, de outros profissionais que acompanham o indivíduo e realizam avaliações que contemplam testes de criatividade, inteligência, traços de personalidade, habilidades acadêmicas, de liderança e habilidades sociais”, esclarece.

Luciana Araújo Barbosa, Pedagoga e Mestre em Educação e Diretora de Supervisão Acadêmica e Projetos Pedagógicos das Escolas IDAAM, esclarece que a pessoa que apresenta altas habilidades demonstra, desde a 1ª infância, resposta cognitiva acentuada em uma ou várias áreas do conhecimento, pois tende a aprender de maneira singular e rápida sobre inúmeros temas. “Como nem todo familiar tem conhecimento ou feeling para identificar as características inerentes a esta condição, é comum que a alta habilidade seja identificada no ambiente escolar. Quando professores e equipe técnica percebem alunos com este perfil, aplicamos boletins continuados de observação e chamamos a família para orientar quanto à maneira adequada de potencializar tal habilidade para o alcance da alta performance”, orienta.

ALTA HABILIDADE OU SUPERDOTAÇÃO?

crianças inteligentes
Crédito: Alexandre Dummer/Unsplash

Uma dúvida bastante comum, inclusive entre pais e responsáveis, é quanto à diferença entre altas habilidades e superdotação. Sobre isso, Cindy Pereira Barros Morão, Psicóloga da Clínica Casagrande, explica que há uma diferença de perspectivas dentro do campo de estudo de altas habilidades e superdotação. “Alguns usam superdotação para contexto acadêmico e altas habilidades para outras áreas. Outros autores usam os dois termos como sinônimos. Não há consenso, portanto. Mas, na prática, os dois termos podem ser considerados sinônimos, já que se referem a indivíduos com habilidades acima da média”. Já Damião comenta que, embora no Brasil não exista diferenciação em termos legais, em alguns países a superdotação é vista como um dos 4 tipos de altas habilidades: precocidade intelectual, talento simples, talento complexo e superdotação.

Outro questionamento habitual é sobre algumas pessoas serem ‘mais ou menos superdotados’ que outras. “A superdotação é um fenômeno heterogêneo. Não existem duas pessoas funcionando de forma igual. O que existem são comportamentos, modo de ser, características da pessoa com superdotação: interesses incomuns à faixa etária, rapidez na aquisição de conhecimento dos seus interesses, criatividade, intensidade emocional, empatia elevada, bom humor, baixa tolerância à frustração, ao tédio, vocabulário acima da média e outros. Não é um checklist, são traços. Nem todo superdotado aprende a ler e escrever aos 2 anos. Temos que tomar muito cuidado com os mitos”, pontua Damião.

É preciso dizer, ainda, que as altas habilidades podem se manifestar de maneira isolada ou combinada. “Existe a superdotação acadêmica em que a inteligência se encontra acima da média, mas existem também outros tipos de superdotação, em que outras habilidades podem estar acima da média. Historicamente, a identificação, quando ocorre, costuma se centrar em habilidades intelectuais e acadêmicas, sendo raro ser identificada nos demais tipos. Entre os outros tipos de superdotação, podemos citar a intelectual, a social, a produtiva-criativa e a psicomotora”, exemplifica Cindy. Além disso, é importante dizer que algumas pessoas se destacam em todas as áreas e outras apresentam desempenho superior em alguma ou algumas habilidades específicas. “As áreas são divididas em capacidade intelectual geral, habilidades acadêmicas específicas, liderança, criatividade e talento artístico”, complementa a Psicóloga da Clínica Casagrande.

Outra questão bastante levantada por pais é sobre a superdotação vir acompanhada de TDAH ou Autismo, por exemplo. “Existem casos em que as altas habilidades ocorrem, simultaneamente, com algum transtorno do neurodesenvolvimento,como os de aprendizagem. E quando isso acontece, normalmente, interfere no cotidiano da criança em todos os contextos. Afinal, não estamos preparados para atendimento ao superdotado típico, imagine com mais especificidades”, alerta Damião. Cindy diz, ainda, que quando existe a dupla excepcionalidade, a criança precisa ser estimulada em suas potencialidades e, ao mesmo tempo, precisa realizar as terapias específicas para os prejuízos decorrentes do outro transtorno do desenvolvimento.

É preciso falar, ainda, sobre outra fantasia relacionada à superdotação, o de que indivíduos com altas habilidades são gênios – esse, inclusive, talvez seja o maior mito da superdotação e o que mais prejudica o diagnóstico/identificação e o atendimento educacional adequado. “Cada pessoa terá um funcionamento diferente. Mas a base é uma habilidade acima da média em áreas de domínios do conhecimento humano, como inteligência, criatividade, capacidade física, capacidade socioemocional e outras. O superdotado em esportes e artes, por exemplo, nem sempre tem quocientes de inteligência muito superiores, mas se destacaram nas suas áreas. Entretanto, o mundo espera o estereótipo de nerd gênio”, avalia Damião. Luciana Araújo complementa: “como o ser humano é dotado de múltiplas inteligências, a alta habilidade de um aluno pode ser em música e ser um aluno considerado mediano na área de exatas, mas reitero que a tendência é que esses indivíduos tenham maior facilidade na construção de conhecimento”.

Mas quando, afinal, deve ser realizado o teste de QI em crianças?

De acordo com a Neuropsicóloga Leninha Wagner, o período da alfabetização é o melhor para fazer o teste - segundo ela, para a testagem apenas de QI, a idade mais indicada é o momento da alfabetização, que acontece sempre antes dos seis anos para crianças com QI elevado. Nessa idade, as crianças já estão aptas ao teste Wisc, no qual poderão passar por uma avaliação mais abrangente, responsável por identificar os pontos de maior e menor habilidade do funcionamento neuropsicológico.

"Esses testes permitem medir as habilidades das crianças em diversas áreas de desenvolvimento, tais como pessoal, social, adaptativo, motor, comunicação e cognitiva. Cabe aos pais e a escola observar e entender o funcionamento dos filhos/estudantes, perceber o seu padrão e interesses intelectuais, a interação social, a rota cognitiva e o perfil emocional, comparando a criança com ela mesma em fases anteriores, para identificar a curva de desenvolvimento e os marcadores esperados dentro de cada etapa", explica.

ESCOLAS PRECISAM ESTAR PREPARADAS

escola
Crédito: CDC/Unsplash

Instituições de ensino sempre querem alunos que se sobressaiam nos estudos, já que, na maioria das vezes, esses estudantes terão boas pontuações em vestibulares e concursos e isso elevará a qualificação do local. Entretanto, muitos desses alunos que chamam a atenção por boas notas têm altas habilidades. E é exatamente com essas crianças e adolescentes que muitas escolas podem errar.

Mônica - que abre a nossa matéria ao lado do pequeno Lucas -  conta que, mesmo com o filho tão pequeno, passou por uma situação muito ruim com a escolinha anterior a que ele está agora. “Procurei a professora e a direção quando percebi a alta habilidade deles e queria uma orientação sobre o que eu deveria fazer. Quando fui mostrar seus desenhos, uma das donas da escola nem quis pegar para ver, disse que todo mundo tem alguma habilidade e perguntou se eu achava que ele tinha alguma deficiência. Saí de lá péssima, me achando ridícula por achar que ele tinha uma alta habilidade”.

Após o ocorrido, ela levou o filho para fazer a avaliação com a psicóloga, que pediu um relatório da professora. No entanto, eles não permitiram que a professora fizesse. “Com tudo isso, ficou muito claro para nós que a escola não tinha qualquer capacidade para atender um aluno atípico”, complementa.Quem também não teve uma boa experiência com a escola onde os filhos estudavam foi Bruna. Ela conta que, embora sempre tenha conversado com as crianças para evitar problemas com excesso de ego ou que não respeitassem as dificuldades dos colegas, foi a escola que não soube lidar com as diferenças.

“É natural que, em algum momento, um elogio acabe acontecendo. E para que eles nunca entendessem de forma errada, resolvemos sempre conversar francamente. E funcionou, tanto que entre os amigos nunca houve problemas. Mas com a escola, sim. Mesmo levando laudos e conversando sobre a necessidade de, em alguns momentos, uma atenção diferenciada para os meninos, não vimos nenhum resultado satisfatório. Então, trocamos para uma escola pública e fomos muito bem recebidos e compreendidos. Inclusive, durante a pandemia, especialmente antes de voltar ao presencial, eles tinham aulas especiais no contra turno e durante o turno quando terminavam as atividades antes dos colegas”, comenta.

No caso do Álex, filho da Barbara, embora a identificação da superdotação tenha partido da própria escola, o dia a dia do menino não é agradável. “Meu filho sofre bullying na escola, e é excluído do meio, pois tenta se adequar com brincadeiras da idade (por exemplo, futebol com os coleguinhas), mas não consegue. Os amigos também não têm paciência com o conteúdo de suas conversas, sobre Geografia e História e o excluem do grupo”, comenta. Para amenizar o problema, ela orienta o menino a sempre agir com paciência e conversar sobre o ocorrido com a professora. Também tem reuniões semestrais com a coordenação e contato direto da coordenadora da escola, para conversarem sobre o que acontece no dia a dia dele. "Também solicitei que ele ficasse em turma separada de uma criança especifica, que sempre o agredia fisicamente durante as brincadeiras”, complementa.

Bárbara conta, ainda, um episódio muito triste que aconteceu com o filho (e que é comum com outras famílias que têm crianças superdotadas), no ano passado. “Infelizmente, pegamos uma professora que só via o lado ruim dele. Com a pandemia e as aulas online, o Álex queria sempre falar sobre os assuntos primeiro, e também quando se desinteressava, mudava de assunto facilmente. Ano passado, ele estava no primeiro ano, mas já era alfabetizado, e foi um ano perdido, com uma professora impaciente, que não sabia lidar com a situação e não o colocava em novos desafios. Nessa época, a escola permaneceu com tom neutro e confesso que procurei outros colégios que atendessem melhor a minha criança, mas naquele momento não conseguimos. Então, resolvemos fazer uma segunda tentativa este ano. Agora são outros problemas, como essa questão de ser ignorado pelos colegas, mas pelo menos a coordenadora tem dado maior suporte, pois ela está fazendo pós graduação em excepcionalidades. Essa semana, inclusive, fui à escola e me acolheram melhor na reunião que tive”, diz.

Sabemos que, habitualmente, crianças que se diferenciam das demais, especialmente na escola, costumam sofrer bullying. O psicólogo Damião Silva explica que, infelizmente, esta é uma realidade cruel vivenciada pelos superdotados muito em função dos mitos, como o do gênio, que são propagados há décadas. “Sofrem dos colegas de turma, de professores e muitas vezes da equipe pedagógica invalidando sua condição. Características físicas, psicológicas e até o fato de aprenderem mais rápido vira alvo e o isolamento social é o primeiro sinal a ser observado, seguido da recusa escolar. As consequências são gravíssimas e impactam de sobremaneira a saúde mental da vítima”, alerta.

Mas como as crianças podem se defender? Em primeiro lugar é preciso dizer que é obrigação da escola proteger o aluno, é claro. Mas a realidade é cruel e a maioria das instituições de ensino não sabe como lidar e não investe em programas preventivos. “A criança/adolescente vítima de bullying deve informar aospais/responsáveis, que deverão notificar a escola. Em casos graves, que não exista a possibilidade de mediação, a família deve fazer boletim de ocorrência. Bullying é crime e as consequências são nefastas”, enfatiza Damião.

SUPERDOTAÇÃO X INTELIGENCIA EMOCIONAL

Que crianças superdotadas costumam se sobressair, nós já sabemos. Mas e quando se trata da parte emocional? Essa maturidade nas tarefas e estudos que acontece na maioria dos casos acompanha a percepção enquanto indivíduo? Mônica comenta que esse tem sido um dos maiores desafios com Lucas. “Ele está em uma fase em que tudo é levado para o extremo no emocional. Exige uma atenção e comprovações de amor um pouco acima do padrão dos familiares e amiguinhos. Todos têm que olhar ele nos olhos enquanto fala; um elogio ao irmão é interpretado como se estivesse sendo preterido; ele tende a achar que não estamos dando atenção suficiente a qualquer machucado dele, mesmo que a gente o beije e acolha”, comenta.

Antes de qualquer coisa, é preciso dizer que a busca pelo equilíbrio não é algo difícil de alcançar apenas para pessoas com superdotação. Na realidade, essa talvez seja a grande questão do mundo moderno. Entretanto, como esses indivíduos são mais intensos, essa necessidade talvez seja mais percebida. Dito isso, caso a criança apresente algum comportamento que seja considerado diferente, a melhor alternativa é investir em autoconhecimento e buscar ajuda profissional.

“Já temos instrumentos validados pelo Conselho Federal de Psicologia para avaliar inteligência emocional e, por meio dos resultados, traçar a melhor estratégia de intervenção. Terapia faz bem em todas as idades. Programas de orientação parental também ajudam. Infelizmente, no Brasil temos um atraso na área da pesquisa em superdotação, especialmente no que diz respeito às características socioemocionais. Pesquisamos muito sobre talento e alto potencial cognitivo. Alguns países, como a Espanha, já estão com centros de atendimento sócio emocional ao superdotado. Temos muito a fazer por aqui desde a identificação, que é feita por uma teoria de atendimento, até o processo de atendimento dos nossos superdotados”, esclarece Damião Silva.

Outra situação bastante comum que acontece com crianças superdotadas é a de, para se sentirem parte de um grupo, seja na escola ou em qualquer ambiente com outras crianças, sufocarem suas habilidades. Esse tipo de reação gera, na maioria das vezes, sofrimento emocional e prejuízos na saúde mental, desencadeando até sintomas de ansiedade, depressão, transtorno obsessivo compulsivo, episódios de pânico, além da redução de autoestima, autoeficácia, procrastinação. Nesses casos, a melhor saída é sempre buscar o melhor atendimento possível.

Ainda falando sobre equilíbrio, mas, nesse caso, mais focado nos pais, uma pergunta que costuma surgir é sobre como agir quando uma família tem dois irmãos, sendo que um superdotado, que vai muito bem nos estudos, e outro que não. Damião lembra que os pais ficam aflitos e já presenciou até alguns negarem o atendimento adequado para superdotados para minimizar conflitos em casa. “É uma péssima ideia. Eles precisam compreender que são filhos com necessidades diferentes e oferecer o melhor suporte sempre. E cabe muito falar sobre individualidade e diferenças. Todos temos algo de bom e dificuldades é inerente à espécie humana. Caso a família tenha dificuldade em lidar com o tema, sugiro procurar ajuda profissional”, conclui.

DIREITOS DA PESSOA COM SUPERDOTAÇÃO

criança na escola
Crédito: Kuanish Reymbaev/Unsplash

Embora muitos pais não saibam, existe uma lei que dispõe sobre a identificação, o cadastramento e o atendimento, na educação básica e na educação superior, de alunos com altas habilidades/superdotação. E para falar mais sobre o assunto, o advogado Denner Pereira da Silva, que é também pesquisador dos direitos da pessoa com deficiência e assessor da Procuradoria Geral do Estado do Paraná, esclarece, abaixo, alguns pontos.

1) Quais são os direitos da pessoa com superdotação no Brasil?

Podemos dizer que os direitos da pessoa com superdotação no Brasil estão relacionados aos aspectos educacionais, com início no ensino infantil e estendendo-se ao longo da vida acadêmica, até os cursos de ensino superior, como determina a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. São direitos relacionados à elaboração de currículos, métodos, técnicas e recursos educativos individualizados à pessoa superdotada, inclusive com a disponibilização de professor especialista e Sala de Recursos Multifuncionais. Para aqueles que necessitam, também há a possibilidade de aceleração, para concluir em menor o programa escolar.

2) As escolas e muitas vezes o poder judiciário acaba dificultando o acesso aos direitos da pessoa com superdotação no Brasil. Como podemos mudar esse cenário?

Políticas públicas. Infelizmente há muito preconceito em relação aos estudantes superdotados, por vezes por ignorância de pessoas leigas sobre o tema, como se o superdotado fosse um gênio, alheio aos prejuízos psicológicos que não necessitasse de apoios escolares. Não é à toa que a Lei de Diretrizes e Bases busca proteger as pessoas superdotadas. Existe razão de ser e a razão é que não se pode punir alguém por uma condição neuroatípica. Não se pode punir alguém por ter inteligência e maturidade acima da média etária.

Infelizmente, quando as políticas públicas de diagnóstico e intervenção precoce da superdotação falham, e falha também a oferta nos apoios em saúde e educação, resta a judicialização, com o Poder Judiciário fixando multas ou sanções às instituições que não cumprem a Lei de Diretrizes e Bases da Educação. É preciso que se crie uma jurisprudência sólida, para que todas as instituições de ensino, públicas ou privadas, tenham ciência dos apoios que comumente os estudantes superdotados necessitam, criando políticas públicas efetivas.

3) Com a perspectiva das mudanças nos planos de Saúde, quais os impactos no atendimento aos pacientes com dupla excepcionalidade, como Autistas com superdotação que precisam de terapias especificas que estão fora do Rol da ANS?

A maior parte das terapias usualmente indicadas para pessoas com dupla excepcionalidade que foram diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista/Superdotação está no Rol da ANS, como por exemplo psicoterapia, fonoterapia e terapia ocupacional. Ocorre que há determinadas especialidades dentro dessas áreas em que se discute se os planos de saúde são ou não obrigados a custear, como por exemplo as terapias com psicólogo especialista em análise do comportamento aplicada (ABA). Alguns planos de saúde no Brasil, após diversos casos de judicialização, se estruturam a fim de fornecer, dentro ou fora de sua rede credenciada, tais profissionais especialistas.

A perspectiva que se cria com o julgamento de “rol taxativo” é que sejam criadas novas barreiras na via administrativa, de modo que os planos de saúde justifiquem uma negativa de terapia com base no julgamento do STJ, ou até que magistrados, em caso de judicialização, passem a negar o direito de custeio dos referidos tratamentos. O tema é debatido nos Embargos de Divergência em Recurso Especial – EREsp 1.886.929 e 1.889.704 no Superior Tribunal de Justiça e por ora não há julgamento definitivo sobro o caso.

*PRISCILA CORREIA é jornalista, especializada no segmento materno-infantil. Entusiasta do empreendedorismo materno e da parentalidade positiva, é criadora do Aventuras Maternas, com conteúdo sobre educação infantil, responsabilidade social, saúde na infância, entre outros temas. Instagram:@aventurasmaternas