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'Não estou escutando!': entenda a relação entre perda auditiva e demência

Existe uma estreita correlação entre a capacidade de ouvir e se comunicar para entender o meio

*Dra. Maura Neves, colunista de AnaMaria Publicado em 14/09/2021, às 08h00

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A perda auditiva não tratada potencializa a desconexão social e cognitiva. - Mark Paton/Unsplash
A perda auditiva não tratada potencializa a desconexão social e cognitiva. - Mark Paton/Unsplash

Escolhi falar um pouco sobre perda auditiva no texto desta semana. Até porque pessoas com perdas auditivas são cada vez mais presentes em nosso dia a dia, especialmente por estarmos vivendo cada vez mais.

Dados sobre a expectativa de vida no Brasil, previstos com base nos resultados do Global Burden of Disease (Carga Global de Doenças- 2017), estimavam a expectativa de vida média no ano de 2017 em 79 anos para as mulheres e 72 em homens. Já em 2100, espera-se que as mulheres vivem até 85 anos e os homens por uma média de 80 anos. 

Esse mesmo estudo mostrou que a perda auditiva é a 3ª causa mais frequente de problemas de saúde, quando consideramos anos vividos com deficiência, atrás até de doença cardíaca (especialmente hipertensão arterial) e artrite. Ou seja: se vamos viver mais tempo, aumenta a chance de desenvolvermos alguma deficiência conforme o tempo passa.

No caso da audição, existe uma estreita correlação entre a capacidade de ouvir e se comunicar para entender o meio. Por isso, a perda auditiva traz grandes impactos na qualidade de vida.

MAS O QUE É A PERDA AUDITIVA NO IDOSO?
Trata-se de uma situação natural que acontece com o envelhecimento. Essa alteração tem o nome de presbiacusia, sendo caracterizada pela perda progressiva da audição em ambos os ouvidos ao longo da vida.

QUANDO COMEÇA?
Normalmente tem início a partir da quinta ou sexta década de vida e, como já mencionei, afeta ambas orelhas e tende a ser pior nas frequências agudas. Atualmente, cerca de 50% dos idosos com 70 anos tem perda auditiva severa, o que afeta a comunicação.

COMO ELA SE MANIFESTA?
Sao dois sintomas principais. O primeiro e, mais fácil, é a dificuldade de ouvir, lógico! Geralmente vem acompanhada daquela frase: o “o que você disse?”. O segundo é a dificuldade de entendimento ou compreensão do que foi falado. Neste caso fala-se uma coisa e a pessoa entende outra completamente diferente.

Isso acontece pois o ouvido tem a função de perceber o volume, além de participar da discriminação dos sons falados, ou seja, do entendimento das palavras. Ambas funções estão comprometidas na presbiacusia.

POR QUAL MOTIVO É PIOR EM ALGUMAS PESSOAS?
A perda auditiva ao longo da vida pode ser piorada por diversos fatores. Ou seja, além do envelhecimento natural, há outras condições que podem se somar e piorar a audição. São elas:

  1. Uso de medicamentos: muitas medicações são tóxicas aos ouvidos, desde antibióticos até drogas contra câncer.
  2. Grau de exposição a ruído durante a vida: aqui entra ruído ambiental das grandes cidades, ambiente de trabalho e até uso de fones de ouvido. Quanto maior a exposição a ruído ao longo da vida, maior a perda com a idade.
  3. Tabagismo: tanto fumar quanto conviver com quem fuma aumenta a chance de perda auditiva no idosos
  4. Doenças associadas: diabetes, doença cardíaca, pressão alta, e colesterol elevado são algumas condições associadas ao aumento da chance de perdas auditivas mais severa
  5. Causa familiar: a herança genética tem grande peso sobre a perda auditiva. Assim os jovens de famílias com idosos com perda auditiva severa devem ficar atentos.

E COMO TRATAR?
Atualmente a única opção é colocar aparelho auditivo. E uma das perguntas que mais me fazem no consultório é se precisa colocar aparelho nos dois ouvidos. A resposta é: claro que sim! Quando temos perda visual, os óculos são em ambos olhos, correto? Aqui não é diferente, pois é necessário o envio de informacão por ambas orelhas ao cérebro.

E SE EU NÃO QUISER COLOCAR APARELHO? 
A perda auditiva não tratada leva a isolamento social, depressão e alterações cognitivas no idoso. O isolamento social vem pela dificuldade de ouvir e entender o que é dito. Por não participar da conversa, o idoso vai gradualmente interagindo menos. Dai a piora de quadros de depressão e demência.

Um grande estudo francês, publicado em 2018 e que acompanhou 3800 pessoas durante 25 anos, e outro australiano, com a participação de 38 mil pessoas, mostram uma relação estreita entre perda auditiva e demência. De acordo com esses trabalhos, a perda auditiva não tratada causa uma chance:

  • 13% maior de perda de capacidade de uso de celulares, gerenciamento de medicação, dinheiro e até compras;
  • 28% maior de desenvolver dificuldades em atividades como tomar banho e se vestir;
  • 43% maior de ter depressão;
  • 69% maior de ter demência.

Em outras palavras, a perda auditiva não tratada potencializa a desconexão social e cognitiva, piorando a qualidade de vida ao reduzir a autonomia do idoso!

DICA FINAL: As máscaras dificultam muito o entendimento do que é dito, pois usamos a leitura labial como pista para enterdermos o que é dito. Assim, nesta fase em que ainda as usamos, a dica é falar um pouco mais alto e mais pausadamente. Isto vai ajudar quem tem perda auditiva a entender o que dizemos!

*DRA. MAURA NEVES é formada na Medicina pela Faculdade de Medicina da USP. Residência em Otorrinolaringologia pelo HC- FMUSP. Fellow em Cirurgia Endoscópica pelo HC- FMUSP. Doutorado pela Faculdade de Medicina da USP. Médica Assistente do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo -SP. Aqui na Revista AnaMaria, trará quinzenalmente um conteúdo novo sobre a saúde do ouvido, nariz e garganta. Instagram: @dra.mauraneves