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Dia da Consciência Negra: Por qual motivo devemos comemorar esta data?

"Cabe a nós cobrar e atuar por uma sociedade mais justa", diz especialista sobre Dia da Consciência Negra

Juliana Ribeiro Publicado em 20/11/2019, às 08h00 - Atualizado às 09h53

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Aline Souza do Nascimento é mestre em Relações Étnico-Raciais. - Arquivo pessoal
Aline Souza do Nascimento é mestre em Relações Étnico-Raciais. - Arquivo pessoal

O Dia da Consciência Negra é celebrado no Brasil em 20 de novembro. Mas você sabia que a data é um marco na memória de luta da população negra, pois traz como referência o aniversário de morte de Zumbi dos Palmares? Ele foi um dos maiores líderes negros do Brasil que lutou pela libertação do povo contra o sistema escravista.

Quem explica é a historiadora e analista do Instituto Identidades do Brasil (ID_BR), Aline Souza do Nascimento, que é mestre em Relações Étnico-Raciais.

"Instituída em 2003, funciona como um convite para conhecermos a memória de luta de toda uma população, que antigamente era simbolizada como passiva. Este dia coloca em pauta tudo o que o povo negro fez e de seu legado na construção da sociedade brasileira. Trata-se de parte da pressão dos movimentos negros para este reconhecimento", ressalta. 

A data busca ainda refletir sobre a posição dos negros na sociedade, pois eles continuam sofrendo com a discriminação racial e a desigualdade social.

"Reconhecer que há luta mesmo diante de contextos adversos, possibilita a conexão de toda uma população que experimenta a dor do racismo, mas que mesmo diante disso atua cotidianamente na construção da sociedade brasileira, com a reivindicação pelo direito à vida, às políticas públicas e participação no crescimento socioeconômico" afirma. 

MITO DO "SOMOS TODOS IGUAIS"

Ela explica que o contexto em que o negro é visto como 'o ofendido' ou 'o agressivo' diante de situações de racismo contribui para permanência da discriminação em nossa sociedade atual. 

"É mais do que desrespeito, é a manutenção de uma estrutura que cotidianamente silencia a experiência social do negro: seja no contexto de violência, de disparidade salarial, ausência de qualidade no atendimento público, tanto na saúde, educação, previdência,  bancário, até em atendimentos jurídicos podemos perceber um comportamento sintomático deste racismo estrutural e institucional", avalia. 

Vez ou outra é possível acompanhar nos noticiários casos de racismo contra famosos e anônimos. Segundo a historiadora, o preconceito está presente em todos os lugares, incluindo o universo escolar, no ambiente profissional e na rua, além do ambiente do futebol. 

"Vemos crescer notícias sobre injúrias raciais aos jogadores, por exemplo, com uma vigilância voltada para ações punitivas. Assim, toda sociedade consegue identificar as ofensas racistas como um erro dado, quando assume a posição midiática", destaca. 

No entanto, Aline chama a atenção para o mito do discurso de que "somos todos iguais", muito utilizado para desqualificar as experiências vividas por negras e negros na sociedade brasileira. 

"Serve para silenciar o racismo que provoca na trajetória da população negra, não permitindo o avanço no debate de que é preciso investir em políticas públicas eficazes, atacando o racismo e sua posição sintomática na morte de 80 jovens negros por dia no país", diz. 

Para ela, o combate ao racismo requer investimento e compromisso de toda a sociedade. "É preciso se colocar em vigilância. Mas admitir que somos permeados pelo racismo não é o suficiente. Cabe a nós, negros ou não, cobrar e atuar por uma sociedade mais justa, pois todos pagam a conta", completa.  

LUTA DAS MULHERES NEGRAS

Segundo a historiadora, o preconceito atinge principalmente as mulheres negras, que ainda estão na base da sociedade e recebem o impacto de todas as formas de discriminação, como o racismo, o machismo e a homofobia. 

"Sou fruto da luta de tantas negras que me antecederam. Se hoje sou uma mulher negra intelectual da Baixada Fluminense é porque caminho trilhas de lutas e conquistas de tantas outras que fertilizaram esta trajetória", ressalta. 

Para Aline, o caminho a ser percorrido ainda é longo, pois ainda estamos muito longe de uma sociedade humanamente justa. Para fundamentar sua fala, ela cita uma pesquisa do Instituto 'Ethos', que diz que, no passo em que estamos, vai demorar 150 anos para equiparação salarial, por exemplo. 

"Mulheres negras recebem em média 56% a menos que mulheres brancas, a taxa de feminicídio aumentou entre mulheres negras e indígenas", destaca. 

OBSTÁCULOS

A atriz Camila Pitanga escreveu um artigo para a revista Cosmopolitan em 2018, onde apontou as dificuldades enfrentadas pelos negros no país.

"E se continuarmos nos calando, se não gritarmos que essas vidas importam, seguiremos enterrando nossos filhos. Negros excluídos em lugares sem o básico para sobreviver. A única mão que o Estado brasileiro estendeu à população negra, até o momento, é a que nos açoita. No meu país a cor da pele determina quem tem três vezes mais chance de ser assassinado. Que igualdade é essa? Ser brasileiro é exaustivo para todos nós. Ser brasileiro e negro é quase insustentável!", ela afirmou, na ocasião. 

Aline conta que a principal dificuldade está na garantia do direito à vida, pois os jovens negros ainda são os que mais morrem em contexto de violência. Já as mulheres negras, além de morrer diante do feminicídio, ainda sofrem com a precarização no atendimento médico e hospitalar. 

Sobre a forma como o atual governo age no combate às desigualdades raciais, a especialista é direta: ''Estamos muito distantes de pensar o combate à desigualdade racial como uma atuação dada pelo atual governo. Mas, diante das ferramentas institucionais que temos, importante é perceber que há vigilância dos Movimentos Negros para se fazer cumprir o princípio constitucional de isonomia".

"É esta vigilância de toda população que precisa ser constante, para que, seja qual for o representante no governo (poder), haja uma pressão na manutenção dos direitos", conclui.