Pretas, periféricas e mães reais: Aline e Alessandra conquistaram espaço e empatia no Instagram
Diariamente somos inundadas por conteúdos que foram cuidadosamente produzidos e compartilhados nas redes sociais. Abrir o Instagram e dar de cara com uma influenciadora que apresenta um estilo de vida que beira à perfeição pode ser massacrante quando olhamos para a própria realidade.
Gradualmente — e com muito esforço — esse cenário tem mudado (ainda bem!). Pessoas que antes não se sentiam representadas no universo digital começaram a se deparar com perfis criados por pessoas mais próximas à realidade e em diferentes configurações familiares: mães solo, mães lésbicas, dupla paternidade, netos criados por avós, entre outros.
“A falta de representatividade de mulheres como nós falando sobre maternidade real, e possível para nós”, dizem as criadoras do perfil ‘Maternidade Sapatão’ sobre a motivação para dar luz ao projeto.
Moradoras do Capão Redondo, periferia da Zona Sul de São Paulo, Aline e Alessandra são mães reais, lésbicas e negras. Juntas, elas idealizaram o perfil que conta as vivências e desafios sendo mães dos gêmeos Jamal e Jawari, que completaram 3 anos em outubro de 2023.
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A criação do perfil nasceu de uma dor: não encontrar famílias que compartilhassem experiências parecidas com as delas. Aline e Alê, como é chamada na web, geraram os gêmeos através do processo de Fertilização In Vitro (FIV), por um programa de útero solidário em uma clínica de reprodução humana.
“Eu e Alessandra sonhávamos em fazer uma Fertilização in Vitro, mas logo desistimos desse sonho, porque não sabíamos da possibilidade de realizar a FIV de forma mais acessível ou gratuita”, dizem em uma das publicações onde narram detalhes da gestação.
O processo começou em dezembro de 2019. Em fevereiro de 2020, a dupla já estava à espera dos bebês. Aline doou os óvulos e Alessandra engravidou. “Quando engravidamos, começamos a fazer uma busca por famílias como a nossa, para além de nos sentirmos representadas, termos referências de parentalidade também”.
“Nessa busca, percebemos que não havia muitas famílias como a nossa: sapatões, pretas e periféricas. Só encontramos perfis de dupla maternidade de uma realidade totalmente diferente da nossa”.
Aline diz que tudo começou quando decidiu compartilhar a rotina da gestação em dupla em seu perfil pessoal no Instagram, a princípio, entre sua própria rede. “Porém, o conteúdo foi alcançando um público que foi chegando no perfil dela e demonstrando muito interesse pelo assunto”. A partir daí, elas decidiram criar o perfil ‘Maternidade Sapatão’.
No perfil do Instagram, elas apresentam a jornada da maternidade sob a perspectiva realista. O objetivo principal é dividir uma realidade que se afasta do universo que simula a perfeição e mostrar a maternidade real.
Porém, a rede se mostrou hostil no começo da empreitada. “A primeira dificuldade que tivemos foi chegar em uma rede social nada receptiva para nós, sem representatividade e onde tudo era e é muito ‘Instagramável’ e perfeito, onde as pessoas nunca erram”.
“Chegar nesse território foi totalmente novo para nós, a gente nunca tinha lidado com a rede social profissionalmente, chegamos de forma humilde, com as nossas ferramentas e possibilidades. Gradualmente fomos conquistando nosso espaço e nosso público, à nossa maneira, dentro da nossa realidade e sem nos render às ‘perfeições’ que a rede apresenta.”
Alê e Aline dividem com a rede momentos marcantes da família: desde o primeiro banho de piscina dos pequenos Jamal e Jawari, até a difícil decisão de matriculá-los na creche. Os desafios da maternidade são relatados dia a dia.
O perfil ‘Maternidade Sapatão’ conta hoje com 37 mil seguidores que acompanham de perto a trajetória da maternidade dupla. O caminho não foi fácil, mas a autenticidade da dupla é a peça chave do crescimento do perfil.
“O mais marcante na nossa trajetória foi perceber que era possível ter uma renda considerável, trabalhando em casa e mais próximas das crianças, porém, também percebemos que como o trabalho de influencer demanda muitas horas, então também têm sido marcante administrar essas horas de trabalho com as nossas outras demandas diárias”, dizem elas.
Hoje, elas conquistaram um espaço que ainda é desbravado nas redes sociais diariamente, empreendendo no digital e cativando a empatia, não apenas das seguidoras que encontraram no perfil da dupla a representatividade, como de marcas que acreditam na diversidade.
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Hoje, Aline e Alê colhem os frutos de um trabalho construído com muito cuidado. “Trabalhar no universo digital nos proporcionou estar em lugares e alcançar objetivos que talvez com um trabalho CLT fosse um caminho mais longo a percorrer para alcançar. Além de poder acompanhar mais de perto o crescimento e desenvolvimento dos nossos filhos, poder flexibilizar melhor nosso tempo.”
Para elas, superação é não ceder aos moldes da perfeição Instagramável: “[Superação é] não entrar nesse mundo de ‘perfeição extrema’ que a rede social prega. É resistir há 3 anos nessa rede, mantendo a nossa essência e autenticidade, mostrando nosso corre real.”
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