Especialistas ajudam a entender o que configura um relacionamento abusivo e como deve ser uma relação saudável
Um relacionamento abusivo nada mais é do que uma dinâmica prejudicial caracterizada pela presença contínua de desequilíbrio de poder, em que um dos indivíduos da relação exerce controle sobre o outro, podendo se manifestar de forma física, psicológica ou tecnológica. Vale mencionar, inclusive, que relações abusivas não se limitam apenas a contextos amorosos, estendendo-se a diversas relações interpessoais, como a entre pais e filhos.
Mas, afinal, por que tanta gente permanece em um relacionamento abusivo?AnaMaria foi buscar possíveis respostas para essa questão. De acordo com a psiquiatra Danielle H. Admoni, supervisora na residência da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP/EPM), a pessoa que sofre o abuso em geral tem uma característica de personalidade que permite isso inconscientemente.
“Às vezes são pessoas mais dependentes emocionalmente, que talvez não tenham muito suporte, que aceitaram se desligar de família, amigos etc. Geralmente, os abusadores são pessoas mais sedutoras, controladoras e narcisistas, que precisam ter o outro abaixo dele para pode se relacionar, não suportando alguém no mesmo nível ou acima”, explica.
“Os abusadores acabam buscando pessoas nesse padrão que são pessoas mais dependentes, com autoestima baixa, que acabam deixando que o outro se imponha e as controlem. Os dois lados acabam não sendo bons para ninguém”, acrescenta a médica.
AnaMaria conversou com Claudia Petry, pedagoga e especialista em Educação para a Sexualidade pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC/SC), para entender melhor as características psicológicas que estão presentes tanto nas vítimas quanto nos abusadores nesses tipos de relações. Veja a seguir:
Danielle destaca que a pessoa que está sofrendo a violência sofre de uma certa patologia também, fica meio adormecida na situação. “Ela não acorda e fala: ‘vou acabar com tudo isso’. Ela não consegue, até porque existe uma manipulação do outro lado, muitas vezes o abusador fala ‘você não pode me deixar’, ‘eu vou morrer’, ‘eu vou me matar’ ou ‘eu vou me matar e matar você’”, exemplifica.
A psiquiatra ainda enfatiza que às vezes acontecem coisas muito mais graves e a vítima corre risco de vida, por isso, dificilmente consegue sair da situação sozinha, sem ajuda dos amigos, familiares e de terapia para superar todos os traumas gerados pela relação desequilibrada.
Um relacionamento abusivo é caracterizado por comportamentos controladores, agressivos e violentos por parte de um parceiro. Por outro lado, um relacionamento saudável é baseado no respeito mútuo, na comunicação aberta e na igualdade entre os parceiros.
“Nos relacionamentos saudáveis, os parceiros se apoiam, se ouvem e respeitam os limites pessoais um do outro. Os conflitos são resolvidos de forma respeitosa, com diálogo e busca de soluções mutuamente satisfatórias”, explica Claudia.
A psiquiatra Danielle Admoni define um relacionamento abusivo como um abuso contínuo, onde o abusador fica em uma posição acima, como se mandasse no parceiro, enquanto a outra pessoa se coloca em uma posição inferior, sendo controlada.
“Quando a gente fala de relacionamento abusivo, vemos uma pessoa só tomando conta e controlando a vida do outro, e a outra pessoa acaba se deixando ficar nessa situação de inferioridade, controle, perda de outras relações. A vida toda vai ficando controlada: como se veste, o que fala, com quem fala, onde gasta seu dinheiro. É uma gangorra na qual somente a vítima fica para baixo e o abusador sempre fica acima”, destaca a médica.
“Essa é a principal diferença de um relacionamento saudável para o abusivo. No saudável quem está dentro da relação foca em fazer com que a dinâmica diária da relação funcione para ambas as partes, onde cada um cuida do que sabe fazer melhor para somar dentro de uma relação na qual ambos vão se complementar. O abusivo só é favorável para o abusador”, enfatiza.
Veja um comparativo entre uma relação abusiva e uma relação saudável a seguir:
De acordo com a pedagoga Claudia Petry, um relacionamento abusivo pode ser identificado por meio de alguns sinais de alerta. Esses sinais incluem controle excessivo por parte de um parceiro, comportamento agressivo ou violento, isolamento da pessoa, manipulação emocional, ciúmes excessivos e desrespeito aos limites pessoais.
“É importante diferenciar esses sinais de conflitos comuns em um relacionamento saudável, onde os conflitos são resolvidos de forma respeitosa e igualitária. Em um relacionamento abusivo, os conflitos são caracterizados por desrespeito, controle e violência”, ressalta a especialista.
Danielle destaca que, no início do relacionamento, os abusadores costumam ser muito sedutores. “O domínio todo parece um cuidado, um carinho extremo, ‘deixa eu cuidar de você’, ‘deixa eu assumir o controle do seu dinheiro’, ‘se afasta dessa pessoa porque ela não é legal para você’. No fim, essas atitudes são apenas uma forma de isolar a pessoa de tudo e de todos”, explica a psiquiatra.
“É importante a pessoa perceber quando sai de um carinho, uma atenção e passa a ser uma coisa muito mais grave, que é o isolamento. Um manda no outro, um controla o outro, mas às vezes no início é muito sutil. A gente fala da lua de mel inicial, onde tudo parece muito bacana, mas na verdade é muito controlador. Então é preciso estar atento para perceber quando a relação sai dessa fase da lua de mel e passa uma relação de controle”, enfatiza.
A falta de reconhecimento dos sinais de um relacionamento abusivo pode levar os envolvidos a permanecerem em situações prejudiciais e perigosas por várias razões. Primeiro, a pessoa pode não estar ciente de que está em um relacionamento abusivo, pois os comportamentos abusivos podem ser sutis e manipuladores.
“Isso pode levar à negação ou minimização dos problemas, fazendo com que a pessoa justifique ou aceite o comportamento abusivo. Além disso, a vítima pode sentir medo das consequências caso saia do relacionamento, como retaliação do parceiro abusivo ou a perda de apoio financeiro. A manipulação emocional e o isolamento também podem fazer com que a pessoa se sinta dependente e sem recursos para sair da situação”, explica a pedagoga.
“A falta de apoio e compreensão por parte de amigos e familiares também pode influenciar na permanência no relacionamento abusivo. Se a pessoa não se sentir apoiada ou se achar que ninguém acreditará em sua situação, ela pode se sentir presa e sem opções”, acrescenta.
A autoestima e a autonomia emocional desempenham um papel fundamental na prevenção e na saída de relacionamentos abusivos. Ter uma autoestima saudável significa se valorizar, conhecer seus próprios limites e ter confiança em si mesmo. De acordo com Claudia, isso pode ajudar a pessoa a reconhecer os comportamentos abusivos e a entender que merece ser tratada com respeito e dignidade.
“Além disso, a autonomia emocional permite que a pessoa tome decisões por si mesma, sem depender da aprovação ou do controle do parceiro abusivo”, explica a especialista. Para fortalecer a autoestima e a autonomia emocional de quem está envolvido em um relacionamento abusivo, ela destaca que é importante buscar apoio e ajuda profissional, como terapia individual ou em grupo.
Isso pode ajudar a pessoa a reconhecer seus próprios valores, desenvolver habilidades de comunicação assertiva e estabelecer limites saudáveis. Ainda: é importante criar uma rede de apoio de amigos e familiares que possam oferecer suporte emocional e prático durante o processo de saída do relacionamento abusivo.
"A educação sobre relações saudáveis e o fortalecimento das habilidades de resolução de conflitos também podem ser úteis para prevenir o envolvimento em relacionamentos abusivos”, aconselha Claudia.
Danielle menciona também que, dependendo da gravidade do caso, cabe até mesmo entrar com intervenção jurídica. “É importante analisar a pessoa, ver o que ela está passando porque muitas vezes a vítima não tem nem ideia do que está acontecendo, acha que um relacionamento é assim e que está tudo bem. E muitas vezes quem está de fora consegue ver, alertar e ajudar a pessoa a sair dessa relação”, pondera.
Conhecer os sinais de alerta pode ser o primeiro passo para cultivar relacionamentos mais saudáveis e gratificantes. Aprofunde-se no tema - separamos outros conteúdos interessantes sobre relacionamentos abusivos:
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