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Jogadinha do Paquetá: seria o Lucas um Robin Hood do futebol?

Especialistas ajudam a entender as muitas camadas que compõe as acusações de fraude em apostas esportivas contra o jogador brasileiro

Lucas Paquetá - Reprodução_Instagram @lucaspaqueta
Lucas Paquetá - Reprodução_Instagram @lucaspaqueta

O caso 

Desde o final de 2023, Lucas Paquetá está na mira da Federação Inglesa (FA) e é investigado por, suspostamente, estar envolvido em um esquema que alterou o resultado de quatro jogos de futebol da Premier League entre 2022 e 2023, na Europa, impactando diretamente no resultado de apostas esportivas. 

De acordo com a acusação, Lucas teria forçado cartão amarelo nos jogos propositalmente, para que pessoas envolvidas com ele acertassem os lances na Betway. 

Segundo informações obtidas pelo jornal The Sun, na Inglaterra, as apostas que foram vitoriosas e ganharam mais de 600 mil libras vieram da Ilha de Paquetá, uma pequena ilha no Rio de Janeiro com 4 mil habitantes, e, terra natal de Lucas. 

Os interesses 

As acusações vieram da própria plataforma Betway, empresa de jogos de apostas esportivas que também é patrocinadora do clube para o qual Lucas trabalha, o West Ham. A Betway cruzou seus dados internos e identificou as apostas suspeitas envolvendo o jogador. Como já mencionado, a própria empresa patrocina o clube de Lucas e, lá, o jogador tem um salário equivalente a R$ 4,3 milhões, valor maior que o obtido com as apostas.  

Com isso, a primeira pergunta que esta coluna fez é: “poderia a plataforma ter se confundido e tudo não ter passado de uma grande coincidência?” Marcelo Calone, CEO do grupo Calone e especialista em Big Data, afirmou que nessas plataformas há uma equipe jurídica e técnica robusta que avalia este tipo de questão. 

“As empresas de apostas geralmente possuem Comitês de Compliance, que são fundamentais para assegurar que elas estejam em conformidade com as regulamentações e leis aplicáveis. Eles também investigam denúncias, comportamento incomum dos apostadores e possíveis fraudes, garantindo transparência e confiança para sócios, investidores, anunciantes e patrocinadores, bem como garantindo a segurança dos apostadores”, explica o profissional detalhando que investidores do clube podem ter prejuízos caso haja fraude. 

Apesar disso, Marcelo não descarta a possibilidade de que tudo não tenha passado de uma grande coincidência. “Embora, em sua maioria, as BETs tenham plataformas muito bem estruturadas no que diz respeito à organização de dados, ainda existe uma pequena chance de que erros possam ocorrer, ou até mesmo coincidências, pois lidam com análises de comportamento humano, e os impulsos que definem as apostas podem ser muito variáveis.” 

Porém, em um cruzamento de dados, as informações que até então eram apenas suposições podem se confirmar ao serem detectados comportamentos suspeitos, repetidos ou incoerentes comparados a um histórico existente, comenta ele. 

Sorte ou técnica? 

No Brasil, as apostas esportivas são enquadradas pela legislação como “jogos de azar” e são autorizados por lei a funcionarem. No entanto, mesmo que definidas como jogo de azar, há quem defenda que esta modalidade de jogo necessita, por parte do apostador, de conhecimento prévio sobre os jogos, ou seja, a pessoa aposta com uma certa margem de “certeza” se irá ganhar ou não. 

Neste sentido, os apostadores que venceram os lances sobre Lucas Paquetá não poderiam simplesmente serem “muito bons”, ainda mais vindos do mesmo lugar onde o ídolo viveu parte da vida? A ligação subjetiva ao astro aliada ao conhecimento prévio sobre os jogos não seria uma vantagem competitiva? 

Armando Costa Neto, advogado criminalista e mestre em Direito Penal pela Universidade de Barcelona e Universidade Pompeu Fabra, na Espanha, comenta esta questão para a coluna e diz que quando estamos falando de “quantidade de cartões”, é possível que estejamos no cenário da “sorte” e não da “técnica”.  

“Existe atualmente o entendimento de que as apostas esportivas não caracterizam jogo de azar em virtude de demandar, do apostador, um certo nível de conhecimento do esporte, da qualidade dos jogadores, das escalações dos times etc. Entretanto, quando vemos as casas realizando apostas com a quantidade de escanteios em uma partida, com a quantidade de cartões amarelos e afins, é muito difícil identificar o fator habilidade ou conhecimento prévio, já que o resultado da aposta depende exclusivamente do fator sorte do apostador. Nesse cenário, esse perfil de aposta deveria ser considerado jogo de azar”,  

Na Inglaterra, o bicho pega! 

Segundo o advogado e professor universitário Ricardo Bastos, do escritório Ferraresi Dias, de Brasília, no Reino Unido as apostas esportivas têm uma adesão ainda maior e mais séria do que no Brasil.  

“Na Inglaterra, as apostas possuem uma força e amplitude maiores. Existem várias casas que se dedicam a essa prática.  Há uma tradição maior do inglês em fazer as apostas”, revela. Nesse sentido, podemos entender o porquê Lucas pode ser banido definitivamente por lá, se comprovada a acusação. 

Senador brasileiro pede investigação! 

Aqui no Brasil, Lucas já está convidado a dar explicações também. Segundo o jornalista Guilherme Amado, do portal “Metrópoles”, o Senador Eduardo Girão (Partido Novo/CE) convidou Lucas Paquetá para depor na CPI da Manipulação de Jogos e Apostas Esportivas, cujo presidente da Comissão é Jorge Kajuru (PSB), Senador e jornalista especialista em esporte. 

“Mesmo que exista uma discussão que avalia se a prática de atos que não interfiram diretamente no resultado de partidas esportivas poderia configurar os crimes previstos nos artigos 198, 199 e 200 da Lei Geral do Esporte, como o cartão amarelo, o objetivo da lei é evitar a prática de condutas que afetem a imprevisibilidade, ou seja, o resultado espontâneo do jogo. Por isso, alguns legisladores defendem que o recebimento de cartões amarelos, de forma intencional, seria um “evento associado” à competição esportiva que altera seu resultado, configurando, assim, a prática de crime”, explica Armando Costa Neto. 

Ainda, ele diz que se Lucas for condenado na Inglaterra, as pessoas que realizaram as apostas aqui no Brasil também podem ser punidas pela legislação. 

“Seja qual for a interpretação sobre o crime praticado, se os da Lei Geral do Esporte ou os Crimes Patrimoniais previstos no Código Penal, os apostadores podem ser responsabilizados criminalmente, pois serão autores ou coautores do crime”, completa. 

Tendo em vista todas essas informações, e sabendo que Lucas Paquetá ganha mais do que o valor das apostas, se ele for condenado e se a fraude for comprovada, podemos pensar nele como uma espécie de Robin Hood, herói mítico inglês que na fábula tirava dos ricos para dar aos pobres.